Fica pra próxima

 


Ser um cronista é extrair um texto do nada. É ser biógrafo de calçada, tornar complicado o que era simples, para torná-lo simples novamente. Ser cronista é desperceber o complexo para ousar o óbvio. Por isso justifico a minha falta de regularidade essa semana. Não era um problema que eu achava que iria encontrar, a falta de ideias pelo excesso de acontecimentos. Aliás, é algo que muito raramente me acontece. No entanto, recentemente as coisas vêm se atropelando, uma por cima da outra. Ainda assim consegui manter o meu compromisso, pelas últimas semanas, de escrever rotineiramente, atrasando um ou dois dias. A onda de novidades era gigante, mas eu ainda conseguia mergulhar por baixo dela. Essa última semana, pelo visto, a onda conseguiu me carregar de um jeito ou de outro.


Não vou mentir e dizer que não tive tempo, não é um problema cronológico. Ainda usando os momentos livres que eu tive para descansar, ver um filme ou outro, ficar olhando o celular, sobrou tempo para escrever. Se realmente estivesse inspirado, teria escrito na casa do meu amigo, enquanto a gente via o jogo do Flamengo (e que jogo!), ou teria escrito no aeroporto, enquanto esperava o meu avião. A verdade é que foi um problema de inspiração.


Veja bem, escrever esses textos como eu o escrevo, é uma obra de vagabundo. Não estou escrevendo sobre grandes fatos, acidentes terríveis ou milagres espetaculares. Estou escrevendo sobre a vida como eu a vejo - tendo em vista o título do blog: “O Outro Observador”. Não obstante, os textos até agora têm sido mais relatos do que crônicas, porque é impossível disfarçar uma mudança de cidade, de vida, de amigos, etc etc. Ainda assim, consigo manter um tom leve, uma reflexão de relações cotidianas, de experiências comuns, mesmo que não atinja o objeto mundano de um texto do Cony ou do Rubem Braga. E assim é, para escrever tenho que ter tempo de observar, a paciência de um olhar desolado, desencantado, que não sofre nem urge.


Para falar outra verdade, tentei escrever esse texto no tempo em que eu tive. Ao ir de carro para um lugar ou outro, entre gravações, após finalizar um roteiro, durante um encontro com meus amigos, esperando meu óculos ficar pronto, fiquei pensando sobre o que escrever e como escrevê-lo. O principal motivo porque eu criei esse blog, como já disse aqui, foi para me forçar a escrever semanalmente, mesmo que eu não tenha um ataque de inspiração. E, não considero que tenha falhado dessa vez, mas aprendido. Todos esses momentos em que eu procurava algo para falar, estava errado. Eu sempre mirava em um texto de apreciação, de agradecimento, como foi o “mais ou menos um agradecimento” da semana retrasada. Queria fazer algo para essas pessoas, amigos e família, que esperavam um reconhecimento igual da minha parte. 


Mas não pude faltar com honestidade comigo mesmo. Eu amo as pessoas com que estive essa última semana, não me entenda mal. A diferença é que eu já os agradeci, diversas vezes, ano após ano. E não é que eu esteja cansado, mas já passou a novidade de como eu os vejo, hoje, virou banal, cotidiano, um amor ordineiro. E não há nada que retire disso uma beleza, pode ser ordineiro, mas ainda os amo. O que é espetacular, uma paixão arrebatadora, pode durar pouco. E vocês ficaram, isso é uma grandeza de outro nível.


Acho que muitos esperavam um texto de Brasília, eu mesmo esperava, já tinha um título pronto e tudo (“Flor do Cerrado”), até comecei a escrever. E não é que ele nunca venha, mas vai esperar um pouco para sair. Como eu disse, comecei a escrever o blog para driblar a inspiração, mas talvez tenha me enganado levemente. Eu não tenho a capacidade de sentar e escrever maravilhosamente sobre o que eu quiser, posso até tentar, mas nunca ficaria satisfeito com o resultado. Mais do que driblar a inspiração, talvez eu precisse aprender a seduzi-lá, até porque, ainda necessitando dela às vezes, é melhor tê-la como amante do que como inimiga. Me enganei ao pensar que o bom escritor era como o engenheiro: simples e metódico. Na verdade, o bom escritor é como um refém em um filme de ação: o máximo que pode fazer é se apaixonar.


Comentários

  1. Ser fiel a si mesmo é uma característica essencial para um escritor. Mantenha-se coerente.

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